(Hesito entre o mundo grave e a gravidade do mundo)

13/11/05

Poesia Vertical, de R. Juarroz

É uma poesia aforística e reflexiva que mete a direito pelas contradições do ser. Como aqui, onde joga com as ambiguidades do desejo: sou eu a abrir-me à alteridade ou ao meu reflexo no espelho?
"Será que tudo o que existe
se espera fora de si?
Será, afinal, que os meus braços
estão abertos para me abraçar?"
Ou ainda:
"Mas haverá fora?"
Os limites do ser, as linhas que cosem o mundo por dentro:
"O ser começa entre as minhas mãos de homem.
(...)
Mas as minhas mãos de homem onde começam?"
A sugestão de uma imanência que que começa na retirada de Deus:
"O silêncio de deus
deixa-me falar.
Sem a sua mudez
não teria aprendido a dizer nada"
Uma imanência que é espaço do incriado:
"E só se encontra alguma coisa
num lugar que se crie"
"Só podemos achar alguma coisa
lá onde não há nada."
A sedução dos espaços-entre, num jogo entre o voyerismo e a alteridade:
"Umas portas tão perfeitas
como que para ficar
para sempre numa porta
E daí
ver passar todas as coisas,
sem entrar nem sair."
E talvez apenas para quem se abre ao lirismo do esquecimento de si a vida reserve "três instantes: o nascimento, a morte e uma flor."